A CPMF foi criada em 1997, no governo de Fernando
Henrique Cardoso (FHC). Destinava-se, segundo a versão oficial, a reforçar o
orçamento da saúde pública, que tantos dizem defender e poucos na prática o
fazem. O então
ministro Adib Jatene usou todo o seu prestigio e vasto conhecimento técnico
para demonstrar a natureza estratégica dessa contribuição financeira na
política de universalização da saúde pública no Brasil. Seria a única forma,
repetia o ministro, das camadas mais pobres terem acesso a uma saúde pública de
boa qualidade. Coerente com a sua
posição histórica de defesa dos interesses do povo, o PCdoB orientou sua
bancada a votar na CPMF, mesmo sendo um governo de direita a quem fazia
implacável oposição. A defesa do povo sempre virá em primeiro lugar. A montanha de dinheiro produzida com a CPMF,
todavia, não chegou à saúde pública. No governo FHC serviu para comprar
goiabada e outros quitutes palacianos; ajudou a fazer superávit primário para tranquilizar
banqueiros e especuladores de toda ordem; também foi usada para tapar eventuais
desmandos da previdência. Foi assim que os tucanos usaram a contribuição por
todo o seu governo. Com a posse do governo Lula, repentinamente, eles mudaram de opinião. Sem uma
resposta a altura eles fizeram crer que os desmandos praticados por FHC era
obra do novo governo. Quanto cinismo! Com apoio ostensivo de todas as entidades
patronais e da mídia que lhes representam eles conseguiram revogar a
contribuição em 2007. Nesse período apesar da CPMF ainda não ser usado exclusivamente em saúde houve
uma clara moralização na sua aplicação. Os estados passaram a receber mais
recursos – o que explica a mobilização dos governadores – e houve uma nítida
melhoria no padrão da saúde pública nacional, embora ainda estejamos longe do
padrão que o povo merece. Por que a direita lutou para revogar uma contribuição
financeira que ela mesma criou? São várias as razões. Vão da mesquinharia –
criar dificuldades ao governo – ao que realmente interessa: a defesa de seus
patrões, os grandes empresários, históricos sonegadores de impostos. É que a
CPMF atirou no que viu e acertou no que não viu e nem previu. Sem querer o
governo acabara de criar o mais eficiente instrumento de controle da movimentação
de grandes fortunas que passeavam pelo sistema bancário sem que essa montanha
de recursos encontrasse correspondências nas declarações de imposto de renda.
Eureca! O governo tinha agora um poderoso instrumento de rastreamento de
sonegadores como jamais dispôs. Isso não podia prosperar. E a direita cuidou de
mobilizar seus parlamentares para sepultar a CPMF, pouco se importando se o
“sumiço” repentino de algumas dezenas de bilhões de reais que irrigavam a saúde
pública não lhe deixaria em colapso. Tudo o que eles queriam era evitar
controle sobre a movimentação de suas fortunas. A preocupação da direita nunca foi com eventuais desvios de finalidade
(exaustivamente praticada no governo FHC), nem mesmo com a tão propalada carga
tributária. No mundo evidentemente há países com carga tributária menor e
também maior do que o Brasil. Entre os mais comedidos estão, dentre outros,
Estados Unidos, Irlanda, Canadá e Espanha, com taxas que oscilam entre 27 a
33%. Acima do Brasil ficam o Reino Unido, a Alemanha, Portugal, Luxemburgo, a
Hungria, Noruega, França, Itália, Bélgica, Suécia e Dinamarca, cujas taxas
oscilam entre 36 e 48%. No Brasil a carga tributária no governo Collor/Itamar iniciou com 23,71 e
terminou com 27,90%, com um aumento de 4,19 pontos percentuais; FHC recebeu o
país com 27,90% e deixou com 32,35%, elevando a carga tributária em 4,45 pontos
percentuais. Nos oito anos de governo Lula a carga tributária oscilou de 32,35 para 34,7%,
registrando o menor incremento (2,35 pontos percentuais) de todos os governos
recentes. Isso não significa concordância com essa taxa tributária, que
efetivamente é alta e condiciona a produção. Tem que ser reduzida porque
penaliza o povo. Empresário não paga imposto, logo não é alcançado por essa ou qualquer outra carga
tributária. Ele simplesmente repassa qualquer que seja os seus encargos para a
sua planilha de custos e debita nas costas do consumidor. Quem se deu ao trabalho de ler esse artigo
até aqui talvez imagine que eu estou fazendo uma defesa dessa contribuição.
Não. Eu sou contra. O governo Lula perdeu essa batalha politicamente. Por
incompetência ou omissão permitiu que a direita fizesse demagogia com o povo e
atribuísse ao governo atual os “pecados” que ela cometeu enquanto governou,
incluindo a própria a instituição da famigerada CPMF. Ademais, a cobrança da
CPMF só penaliza o povo, os assalariados, mesmo que eventualmente se encontre
meios legais de isentá-los totalmente. Eles serão alcançados pela planilha de
custo dos empresários. O financiamento da saúde, necessário e inadiável, deve
vir da taxação de grandes fortunas ou de outro meio mais engenhoso que a nossa
criatividade certamente desenvolverá. Como, de igual forma, temos que encontrar
um instrumento que efetivamente possa fazer o que mais apavora a direita
brasileira: o controle sobre a sonegação que eles praticam a luz do dia. Isso é
o que efetivamente eles querem evitar.